quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Se é por falta de Adeus



A essas alturas ele já é ex. Já descansa em Castelgandolfo, seu castelo predileto e provisório.
Foi tarde, eu diria.
Quer dizer, diria que ele nem deveria ter vindo.
Não fará falta.
Expectativas de melhoras? Não, nenhuma!
A igreja católica seguirá sendo o que sempre foi. Sempre estará dois séculos atrasada em relação ao tempo atual.

Entretanto, pela sua importância - afinal o sujeito era o chefe de um Estado - rendo minhas homenagens.

Tchau, Benedito. Até!




quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

George, 70 anos


Domingo George Harrison teria completado 70 anos se vivo fosse. Durante muito tempo, sobretudo na adolescência, meu beatle preferido era o John Lennon, certamente pelo seu ar mais contestador. Depois era Paul McCartney. Ringo e George, nessa ordem, sempre eram relegados  a terceiro e quarto planos. Com o avançar da idade, passei a prestar mais atenção em George. Acabei descobrindo que, das músicas dos Beatles, as que eu mais gostava eram dele. Enfim, seguem duas das minhas prediletas. Uma singela homenagem.









terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Caluda, tamborins!




Certa vez inventaram uma tal Academia Brasileira de Música Popular. Um dos pretensos acadêmicos era Mario Lago. Ele achou essa história muito estranha, mas não perdeu a oportunidade de fazer sua homenagem. Deixo aqui as palavras dele sobre o tema.





Em 1941, já esquecido dessas brincadeiras, eu estava em Belém do Pará quando anunciaram a criação da Academia Brasileira de Musica Popular. Achei a notícia estranha: quererem misturar academia, que é uma coisa estratificada, até conservadora, com popular, adjetivo relativo a povo, mutação constante, inquietação permanente. Mais do que estranha, porém, a notícia era preocupante para mim. Meu nome estava entre os 40 membros fundadores da instituição. Quer dizer, eu não podia mais fazer os meus sambinhas sem compromisso "mulher você vai se arrepender de tanto me fazer sofrer". Agora, eu era um acadêmico. Estava obrigado a fazer letras que fossem além de qualquer esquina, campo de futebol ou botequim, que tivessem o sabor de estilo acadêmico. 

Aquilo pedia uma resposta. Estavam me oferecendo de bandeja a oportunidade de fazer uma boa molecagem, e não seria eu, moleque desde o Jardim da Infância, que iria perdê-la assim, sem mais nem menos. Fiz, então, a marchinha de rancho "Caluda, tamborins! Ou De como o biltre do demo enredou em sua parlanda a trêfega Natércia", que foi gravada pelo Chico Anysio e pelo Eduardo Duzek:

"Caluda, tamborins, caluda!
um biltre o meu amor arrebatou.
No paroxismo da paixão ignota
Supú-la um querubim.
Não era assim.
Caluda, tamborins, caluda.
Soai plangentemente, ai de mim!
Vimo-nos num ror de gente
E sub-repticiamente o olhar seu me dardejou.
Cáspite, por suas nédias madeixas,
que suaves endechas (*)
em pré-delíquio
o pobre peito meu trinou.
Fomo-nos, de plaga em plaga,
Pedi-lhe a mão catita, em ais de êxtase m’a deu.
E o dealbar de um amor em sua pulcra mirada resplandeceu.
Olarila! (**)
Caluda, tamborins, caluda, etc.
Férula, ignara sorte
v solerte a garra adunca em minha vida estendeu.
Trêfega, ia a minha Natércia,
surge o biltre do demo, rendida à sua parlanda, ela se escafedeu.
Vórtice, no imo trago,
são gritos avernais que no atro ódio exclamei.
Falena sou, desalada, Ó, numes, ouvi-me
Aqui Del-rey!"


Uns membros da Academia acharam que aquilo era um deboche e que eu deveria ser expulso. Ameacei fazer um samba chamado "Nefanda, conspurcaste meu tálamo" e cheguei a mandar o refrão a alguns amigos:

"Nefanda,
conspurcaste meu tálamo
Truão de mim tu fizeste com tuas aleivosias
E agora eu vivo de cara à banda. Ó nefanda!"


Não acabei o samba, porque o assunto de minha expulsão já nasceu morto. A exemplo da tal Academia Brasileira de Musica Popular, que acabou por ali. 




O texto foi retirado daqui: http://www.mariolago.com.br/sexto_capitulo.php

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

O Evangelho Segundo o João

Por ROBERTO VIEIRA

Não. Não fiquei triste com a morte dele. Pra que mentir? Não pude me vingar. Eu preferia que ele nem tivesse existido. Pouparia muitos do desemprego, da vergonha. Você não imagina o que é rirem de você. Milhares de pessoas rindo de você, como se você fosse um palhaço de circo mambembe. Até mesmo seus amigos, seus filhos, rindo.

Eu sempre joguei sério. Na bola. Sempre fui respeitado. Quando era pequeno rezava todas as noites para ser um craque. Um jogador de futebol. Eu acreditava nas minhas orações. Obedecia meus pais. Pedia a benção. Vim jogar no Rio. Virei capa de revista. Comecei a sonhar com a seleção. Foi aí que meu mundo virou de pernas pro ar.

Eu o conhecia das peneiras. Um aleijado. Dava pena. Chegava calado e saía mudo. Quando os técnicos viam aquelas pernas eles o mandavam embora. Mas ele sempre voltava.
Foi então que um dia eu soube que ele enfeitiçou o Nilton. Logo o Nilton, meu ídolo! E foi escalado pra jogar no Botafogo. E começou a fazer gols.


Imaginei que devia ser piedade divina e fiquei na minha. Um dia nosso destino iria se cruzar. E seria seu fim.

Coronel e Jordan tinham conversado comigo:

'Cuidado!'

Eu fiquei rindo. Ele também tinha enfeitiçado os dois. Prometi a mim mesmo que eu ia acabar com aquela palhaçada.

Chegou o dia. Domingo. Maracanã lotado.

Batem o centro. Vem a primeira bola e eu me antecipo. Sério. Na bola. Toco para o ataque e volto correndo para minha posição. Sem pena. Pois o que Coronel e Jordan sentiam era pena. Eu ia mostrar ao mundo a farsa das pernas tortas.

A segunda bola escapou de suas chuteiras.

O primeiro tempo se encaminhava para o fim quando ele domina a pelota. Eu entro no meio do joelho dele. Sem pena. Pra quebrar. Ele cai. Olha o joelho. Levanta.

Alguém na geral grita:

'Quebra ele!'

Ele sorri. Para a geral e para mim. Como um passarinho no alçapão. Aquilo me desconcertou. A pancada que eu dei poderia derrubar uma parede. Mas ele levantou sorrindo pra mim.
O Maracanã lotado.

E a bola chegou até ele um segundo antes de mim. E ele partiu na direção do gol. Eu atrás. Ele parou, súbito. Eu passei, lotado. Voltei e dei um carrinho. Ele escapou pela direita. Eu levantei e ele driblou pela esquerda. Beijei o chão. Ele cruzou na cabeça de Paulo Valentim. Gol.

Perdi a conta das vezes em que fui driblado. Não vi mais a cor da bola. O Botafogo venceu por 6x2. Alegria do povo.

Porém, um lance ficou gravado em minha memória. Sem dribles. Pisei num buraco. Chorei de dor. Ele partia em direção ao gol. Seria o sétimo gol. A torcida já gritava '7, 7, 7'... As mesmas pessoas que gritavam 'quebra, quebra, quebra'.

Inexplicavelmente ele parou e tocou a bola para fora. Tocou a bola para fora pra que eu fosse atendido.

Fratura. Aleijado. Ele me ajudou a sair de campo.

Nunca mais nos vimos.

Eu vim trabalhar nessa fábrica. As capas de revista eu guardo lá em casa.

Com o tempo ele virou gênio. Tão aleijado quanto eu. Cheio de mulheres. De fama.

De vez em quando vem um jornalista como você vem me entrevistar.

Quer saber a verdade. A verdade?

A verdade é que não. Não fiquei triste com a morte dele. Pra que mentir? Não pude me vingar. Eu preferia que ele nem tivesse existido.

Texto publicado no Blog do Roberto